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Postado por Autismo em Dia em 30/jun/2022 - Sem Comentários
DI-VER-SI-DA-DE. Será que, lendo pausadamente esta palavra, conseguimos pensar nela por um pouco mais de tempo e de uma forma mais ampla? Certamente, você ouve ela quase todos dias, a ponto de, muitas vezes, passar despercebido do seu real significado. E hoje, como sempre fazemos, vamos falar sobre autismo. Mas, também, sobre diversidade.
Algumas pessoas, no entanto, podem pensar que isso seria como “chover no molhado”. Afinal, poder falar para um público amplo sobre autismo e tudo que envolve a condição já é uma forma de promover diversidade dentro da sociedade.
Mas, ainda que autistas já representem uma forma de diversidade, eles estão inseridos de maneiras profundas dentro de outras formas do termo. Autistas, antes de tudo, são indivíduos na sociedade. E, enquanto parte da sociedade, o espectro aparece entre pessoas pretas, pardas, pobres, ricas, lgbtqia+, imigrantes, pessoas com deficiência física… E quantos outros recortes demográficos e geográficos você imaginar.
Afinal, que caminhos estamos trilhando para diversificar as pautas do autismo?
Índice
Em janeiro deste ano, 2022, uma pesquisa da Universidade da Carolina do Norte sobre autismo revelou algo assustador. A pesquisa, que buscava entender padrões em relatórios e inclusão de participantes diversos quanto à raça ou etnia, mostrou que a maioria dos estudos sequer considera, de fato, esses dados. E, ainda, quando cor da pele e etnia são informações consideradas, os resultados quase sempre demonstram uma participação pequena de pessoas não brancas. ¹
O resultado um tanto quanto desastroso, podemos dizer assim, é que isso gera uma desigualdade sistêmica em diagnósticos e outras pautas de interesse. Portanto, como é que as pessoas que dependem da eficácia desses resultados podem entender se as intervenções estão tendo o resultado que se espera? ¹
A maioria das novas práticas que sugerem os resultados desses estudos estão sendo validadas por e para crianças brancas que vivem em grandes centros urbanos. Nisso, exclui-se outras opções que poderiam, inclusive, ser melhoradas através de novas concepções linguísticas e culturais. ¹
A pesquisa citada analisou estudos pelo mundo todo feitos entre os anos de 1990 e 2017. Ao longo desses 27 anos, apenas 25% dos artigos relataram quaisquer dados sobre cor e etnia. E, embora tenha sido notado um padrão de mudança ao longo do tempo, trata-se de um crescimento de diversidade de só 0,9% por ano, na média. ¹
Quanto aos últimos, é como se eles fossem categoricamente ignorados.
Na divulgação da pesquisa, a professora Jessica Steinbrenner, PhD, que comandou o estudo, comentou o caso. ¹
“Relatar a raça e a etnia dos participantes é só um pequeno passo para tratar questões relacionadas à equidade. (…) Acho que é um alarme para a comunidade de pesquisa (…), pois há grupos que estão muito sub-representados. (…) Os pesquisadores de autismo devem garantir que suas práticas de pesquisa promovam inclusão, equidade e representação.”
Como forma de conclusão do estudo, Steinbrenner e sua equipe recomendam algumas práticas para pesquisas futuras: ¹
Acesse o estudo detalhado clicando aqui. Disponível apenas em inglês.
As expressões artísticas costumam, sem dúvida, acompanhar e refletir o tempo em que elas são feitas. Se, nas décadas anteriores, a diversidade “autística” era praticamente invisível em filmes, séries e livros, hoje, no entanto, já não existe desculpa para isso. Inclusive, o TEA é assunto real de interesse no protagonismo de muitas histórias.
Aqui no Autismo em Dia, por exemplo, temos alguns artigos com intuitos mais culturais em que damos dicas de filmes e livros. Podemos incluir, ainda, o nosso texto sobre famosos que são ou possivelmente são autistas.
E é a partir desses artigos que a gente vai analisar se, de fato, a representatividade cultural também se faz presente no entretenimento.
No nosso artigo, entre filmes e séries, citamos 13 produções disponíveis em alguma plataforma audiovisual no Brasil. Porém, por mais ampla que a lista se esforce para ser, não foi uma tarefa fácil. Garimpamos títulos em vários lugares, porém quase todos falam de famílias brancas de classe média.
Os únicos da lista que trazem um ponto de vista diferente são os filmes “O milagre na cela 7” e “Como estrelas na Terra”. As produções são, respectivamente, da Turquia e da Índia. Por seu apelo emocional, esses filmes acabaram chegando forte para o público norte-americano. No entanto, as demais produções foram feitas nos Estados Unidos e, entre elas, apenas o curta-metragem “Fitas” tem uma protagonista negra.
Todos os outros falam, em essência, da mesma estrutura de família americana de classe média branca.
Porém, nenhum desses casos espanta mais pela falta de diversidade do que a série documental “Amor no Espectro”, da Netflix. O teor do programa repercutiu de maneira positiva, mas com ressalvas. Em um artigo do popular site internacional Spectrum News (disponível aqui, em inglês), a série foi definida como “gentil, mas nada representativa”. ²
Opinião totalmente justificável. O elenco da série, composta de casais reais, é quase inteiro de pessoas brancas e heterossexuais. Neste caso, boas intenções não foram suficientes. E, agora, na segunda temporada do programa, nenhuma novidade quanto a isso. ²
Do nosso artigo sobre livros, quase 100%, são de autores brancos. Porém, aqui a responsabilidade não é tanto dos autores, mas de uma organização do mercado literário que falha ao não investir em vozes diversas, tanto na ficção como em publicações teóricas.
Até mesmo por conta de um risco de apropriação indevida de uma cultura, autores tendem a escrever muito mais do ponto de vista de sua própria cultura e realidade. Ao contrário do cinema, em que é muito mais fácil integrar diferentes referências na ficção, pois é um trabalho feito em equipe.
Logo, se não tem diversidade na ficção, o interesse em histórias reais segue o mesmo caminho. No nosso artigo sobre famosos que vivem o transtorno, até podemos dizer que existe uma variedade geográfica, mas não de cor. E isto porque as pesquisas realmente não levam para histórias mais diversas. Por enquanto, podemos apenas teorizar. Mas é bem provável que isso seja resultado de uma invisibilidade histórica de pessoas não brancas nas estatísticas do autismo.
Esperamos que, num futuro breve, a gente possa voltar aqui e contar resultados bem diferentes disso.
Falar de diversidade é como atravessar um funil. Quanto mais fundo, mais questões específicas você encontra. E, quando falamos de autismo, é comum e verdadeiro que qualquer pessoa afirme que nenhum autista é igual ao outro. E não são apenas as peculiaridades do autismo que formam o autista, mas tudo que está ao redor dele como indivíduo, também. ³
Consciente ou não deste fato, a verdade é que isso tem gerado disparidades tanto quanto oportunidades de uma nova visão sobre o diagnóstico.
Uma análise multidisciplinar de uma criança cujo comportamento está ainda sob investigação deve levar em conta, também, a diversidade de fatores determinantes. Principalmente aqueles construídos de forma coletiva.
Afinal, que linguagem aquela pessoa entende? Existe alguma relação comportamental que conversa com a comunidade em que essa pessoa vive? Existem padrões de condições de vida e visão de mundo? Os profissionais disponíveis para começar as intervenções entendem aquela realidade ou ainda estão buscando um padrão cômodo e confortável que funcione em qualquer situação? ³
A diversidade, muitas vezes, existe a um bairro de distância, na mesma cidade. Está relacionada, de fato, à individualidade, à família, à comunidade local e aos fatores políticos. Entender cada detalhe e como eles agem na construção de uma unidade mais ampla, é a chave para tornar o tratamento social e médico do autismo cada vez mais eficaz. ³
O Autismo em Dia tem um compromisso com a diversidade nos conteúdos. Seja contando histórias reais, notícias científicas ou dando dicas valiosas, buscamos vozes diversas de todas as maneiras. Mas, como tudo na vida, nossa construção e melhoria são constantes. Por isso, você, como leitor, é parte essencial nesse processo.
Sua opinião é, sem dúvida, muito importante e você pode deixar seu comentário aqui embaixo, no final do texto. Ou, ainda, interagindo com nossos conteúdos no Facebook, no Instagram ou no YouTube!
Esperamos te ver de volta! Muito obrigado pela leitura e até a próxima!
Referências Bibliográficas e a data de acesso:
1. Universidade da Carolina do Norte – 14/06/2022
2. Spectrum News – 14/06/2022
3. Scholars – 14/06/2022
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