Categorias
Posts Recentes
Postado por Autismo em Dia em 15/nov/2021 - 12 Comentários
Psicologia e autismo são duas coisas que não desgrudam uma da outra. Muitas vezes, o profissional da área é a primeira pessoa a dizer para um pai ou uma mãe que existem chances de um diagnóstico. Ou seja, a relação de um psicólogo com o autismo é íntima. E, sem dúvida, esse profissional é alguém que faz a diferença.
Por isso o nosso quadro de proTEAgonistas, dessa vez, está um pouco diferente. Fomos conversar com a psicóloga curitibana Mayara Izidoro (CRP 08/19389), que há 10 anos trabalha a psicoterapia com crianças e adolescentes. Seu ramo de atuação inclui menores de idade que tenham algum tipo de transtorno. Entre seus pacientes, estão crianças com autismo, TDAH (transtorno de déficit de atenção com hiperatividade), dificuldades de aprendizado, dislexia, entre outros transtornos.
Mayara falou um pouco do seu papel como profissional, no entanto, ela também fez diversas reflexões sobre questões sociais que envolvem o autista, a família do autista e o psicólogo. Acompanhe com a gente!
Índice
Para quem não está tão por dentro do assunto, pode parecer que o TEA surgiu há pouco tempo, mas isso não é verdade. No entanto, é fácil entender de onde poderia vir essa ideia de que “na minha época não existia autismo” e outras ideias equivocadas. Houve, sem dúvida, e continua acontecendo, uma exposição cada vez maior do assunto. Por consequência, há mais consciência da sociedade e das famílias. Logo, mais diagnósticos.
Perguntamos a Mayara ao que ela atribui esse aumento de visibilidade do autismo.
“Hoje, no meu consultório, eu recebo principalmente crianças que vêm com o encaminhamento da escola. A escola nota alguns sinais e encaminha para a avaliação. Geralmente esses sinais são da parte de psicopedagogia, pois eles percebem que a criança está enfrentando dificuldades no ambiente escolar.
E é uma coisa que eu converso com os pais porque eles questionam dizendo que na época deles não tinha isso, não tinha aquilo. O que eu explico para eles é que, provavelmente, crianças que estavam dentro do espectro num grau mais leve, acabavam passando despercebidas. Elas eram tidas como esquisitas, a situação ia passando de um ano para o outro e ficava de lado, esquecida.
Por outro lado, as crianças com autismo mais severo acabavam tendo o diagnóstico errado. Acabavam indo para uma escola especial, com diagnósticos como ‘deficiência intelectual’ sendo que na verdade deveriam ser outros diagnósticos.
Hoje, com os professores e outros profissionais se especializando nos diversos transtornos, não é que a gente esteja vendo mais, não é que tenha mais. É que hoje a gente consegue encaminhar as crianças para os tratamentos mais adequados”, conta Mayara.
Apesar da importante presença da escola e dos professores na linha de frente do processo até o diagnóstico, Mayara explica que isso forma um perfil muito específico das crianças que chegam no consultório.
“A gente tem dois perfis de crianças: aquelas que chegam muito cedo, por encaminhamento do neurologista. E crianças que chegam mais tarde, por volta dos 6 ou 7 anos, com dificuldades que são os professores que observam. Às vezes é uma dificuldade de comportamento e socialização, às vezes alguns atrasos, ou até mesmo determinadas estereotipias. Ou seja, algo que chama a atenção deles.
Eu tenho percebido que, de uns cinco anos para cá, os professores estão mais atentos, sim. Não sei se isso é um reflexo das políticas públicas que vem sendo desenvolvidas. Elas, sem dúvida, causam uma pressão maior em cima dessas escolas.
É claro que ainda existe um longo caminho a percorrer. No entanto, os professores estão mais atentos. Eles já conseguem identificar algumas coisas. Não que eles, necessariamente, apontem o que é, de fato, autismo, o que é TDAH. Mas eles conseguem identificar algo que não está dentro do padrão típico. E, a partir disso, eles chamam esses pais para uma conversa.
A primeira conversa é a mais difícil. Pode ter uma certa resistência dos pais em procurar diretamente um profissional de psicologia, um certo medo de um diagnóstico final. Então a escola vai trabalhando, conversam uma vez, duas, três. Até que os pais decidem procurar um profissional que possa fazer uma avaliação mais detalhada”, conclui Mayara.
Uma das dificuldades mais notáveis de disseminar a consciência do autismo na sociedade é, sem dúvida, traçar um perfil claro do que é estar no espectro. Muito diferente de outros transtornos, o autismo não pode ser definido como resultado da soma de fatores específicos. Autistas são, como regra, muito diferentes uns dos outros.
Se você for ler, por exemplo, as outras histórias presentes aqui no nosso blog, vai conhecer autistas com diferentes dificuldades e habilidades. Diferentes trajetórias de intervenções.
Mesmo assim, alguns déficits ficam mais marcados no conceito do que é ser autista por estarem presentes em muitas crianças e adolescentes. Mayara contou para nós quais são os perfis de autistas mais comuns em sua trajetória.
“Dentro da minha prática hoje, como eu estou trabalhando muito com a psicopedagogia, surgem muitas crianças com dificuldades na alfabetização e na aprendizagem no geral. Muitas vezes isso vem acompanhado de uma dificuldade comportamental. Na sala de aula, muitas vezes, os professores não sabem como contornar essas situações, o que faz com que eu trabalhe o que chamamos na psicologia de ‘comportamento de aluno’.
O que eu vejo no meu consultório está muito mais ligado a essas características. No entanto, existem muitos outros fatores que vão se somar para a criança ser diagnosticada com autismo. É uma soma de vários sinais, nunca uma coisa só”, explica.
Durante o acompanhamento psicológico de um autista a família é, sem dúvida, um pilar importante no desenvolvimento. Os pais precisam acompanhar de perto o que está sendo feito. Porém, como Mayara explica, seu trabalho também é tirar a família da passividade e trazer pais e mães para um acompanhamento ativo.
“O envolvimento dos pais do autista é primordial no tratamento. No primeiro momento, a gente trabalha com a psicoeducação. Ou seja, fazer com que os pais entendam quais são os sinais, como é o quadro de autismo daquela criança, como o filho deles se comporta frente aos estímulos.
Por exemplo, eu faço bastante orientação parental, pelo menos uma vez por mês. Ou eles mesmos vão trazendo perguntas durante as consultas, dependendo do formato de acompanhamento daquela criança. Existem crianças que eu faço duas vezes por mês. Outras, no entanto, chegam a fazer cinco sessões por semana.
Então eu estou sempre indicando atividades para eles fazerem em casa, para ajudar na alfabetização, o aprendizado de raciocínios lógicos e matemáticos. Mas não podemos esquecer, também, da escola e dos outros profissionais. Todos precisam falar a mesma língua que a criança. Se cada um caminhar para um lado, o tratamento não vai para frente”.
Mayara ainda completa o assunto falando sobre como isso se dá na prática.
“É muito interessante ver o envolvimento da família. Por mais difícil que seja para eles receberem o diagnóstico e não saberem bem como vai ser lá na frente, eles aproveitam para fazer muitas perguntas. Eu preciso ter todo cuidado possível para deixá-los seguros de que, se a gente trabalhar com essa criança, ela vai se desenvolver. É um desafio, porque nem todas as famílias respondem do mesmo jeito. Mas é, também, muito gratificante”.
Quando falamos sobre psicologia e autismo, é impossível ignorar o quanto o acesso das famílias a isso pode ser uma bolha de privilégio. Conseguir um profissional como Mayra para avaliação e, posteriormente, acompanhamento, é uma realidade distante de muitas pessoas – em especial, aqui no Brasil.
Algumas famílias, com muita dificuldade, até conseguem começar. Mas então acontecimentos de grande abalo como a pandemia de 2020 surgem como uma pedra no sapato. O desemprego e o risco de encontros presenciais fizeram com que muitos pais e mães interrompessem o tratamento de seus filhos – na maioria dos casos, a contragosto.
Com o tempo, muitos pais e mães percebem o impacto disso no desenvolvimento da criança. Mayara afirma que isso é uma realidade em seu consultório.
“No meu consultório eu atendo somente consultas particulares. E eu vejo muitas famílias insistindo em oferecer o melhor para os filhos mesmo diante de uma dificuldade financeira. E não é só a parte da psicologia, ainda tem as outras intervenções, que eles geralmente procuram fazer de formas mais acessíveis. Por exemplo, por convênios do plano de saúde ou mesmo na escola e na rede pública. Com certeza, a questão financeira pesa muito, porque o tratamento multidisciplinar é caro.
Durante a pandemia, muitas crianças que eu atendia tiveram que parar o tratamento por não conseguirem bancar. Mesmo agora nesse momento de retorno, muitas ainda não tiveram como voltar.
E a gente vê que, com o aumento do número de diagnósticos, mesmo o serviço público já está sobrecarregado, sofrendo com a falta de salas e de profissionais. As famílias que pagam, muitas vezes, precisam de ajuda de outras pessoas – da família e de fora – para complementar o custo do tratamento. Apesar das dificuldades, vejo que as famílias fazem de tudo”, finaliza.
Quando Mayara nos fala sobre como as famílias acabam contando com outras pessoas, nós vemos um claro exemplo da importância das redes de apoio. Seja digital ou presencialmente, até mesmo uma coisa simples, como compartilhar uma informação ou uma experiência, já pode ajudar.
Aqui no Autismo em Dia temos o propósito de levar informação de qualidade ao máximo de pessoas possível – seja sobre psicologia e autismo ou outros temas. Por isso, contamos as histórias dos proTEAgonistas. Inclusive, você pode ser a próxima pessoa a contar a sua história por aqui. Entre em contato com a gente pelos comentários ou mesmo pelas redes sociais, Facebook ou Instagram.
Finalizamos aqui com a história da Mayara, mas desde já agradecemos a todos os profissionais de psicologia que se dedicam ao autismo 🙂
Até a próxima!
“O Autismo em Dia não se responsabiliza pelo conteúdo, opiniões e comentários dos frequentadores do portal. O Autismo em Dia repudia qualquer forma de manifestação com conteúdo discriminatório ou preconceituoso.”
Muito importante, gostei e aprendi.
💙
Gostei muito dessas informações.
💙
Muito bom conhecer o trabalho com autistas.
💙
Parabéns pela entrevista , muito importante saber o quanto o profissional psicólogo pode ajudar as crianças com autismo !
💙
um bom conteúdo tudo que lir muito esclarecedor obrigada.
Obrigada por seu comentário, Fabiana!
Um abraço!
amo a minha área, lidar com a mente humana, é seus conflitos, internos, é externos, em seus gatilhos opressores na extremidade da memória killer 🤗🔱📜⏳😇 saúde é paz para Dr. Nayara elecelente profissional
Obrigada, Danilo!