Autismo na vida adulta: como o esporte salvou a vida de Vinícius


Postado por Autismo em Dia em 14/abr/2021 - 11 Comentários

Você consegue imaginar como é passar uma vida inteira se perguntando por que você não consegue destravar sua relação com as pessoas? E, de repente, descobrir o autismo na vida adulta e só então tudo fazer sentido? Foi o que aconteceu com o Vinícius Monteiro, de São Paulo, capital.

Hoje, aos 36 anos, ele relembra com a gente sua trajetória. Foram os vários anos de terapia para tratar outros distúrbios que fizeram com que ele chegasse ao diagnóstico de TEA. Mas em meio a tudo isso, a sua relação com o esporte ajudou a dar sentido para a própria vida e fez com que ele superasse várias dificuldades.

É por isso que ele é o nosso proTEAgonista da vez. Venha com a gente conhecer essa história!

Autismo e esporte

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Vinícius Monteiro

Índice

Por que Vinícius só descobriu o autismo na vida adulta?

Desde 2011 Vinícius faz terapia para controlar a depressão e bipolaridade. Numa das sessões, a psicóloga disse para Vinícius que desconfiava que ele pudesse ser autista e começou, então, a fazer perguntas específicas nesse sentido, a fim de chegar a alguma conclusão.

Pouco tempo depois, Vinícius teve, enfim, o diagnóstico. Mas nesse caso podemos dizer que foi bastante tardio, afinal, Vinícius já tinha 30 anos.

Nesse momento, Vinícius passou olhar para a sua história de outra forma. Apesar de depressão ser uma comorbidade comum em autistas, seus anos de terapia mostraram que o desenvolvimento dessa doença teve muito mais a ver com questões que aconteciam na sua família, da qual Vinícius não deu mais detalhes.

Porém, o fato de ter, por fim, o diagnóstico de autismo, jogou luz para seus problemas sociais.

“O autismo mudou a minha forma de ver alguns acontecimentos da minha vida. Por exemplo, a minha relação com pessoas, coisas que eu não entendia em comportamentos, etc. As coisas começaram a fazer sentido. Eu sempre fui fechado e mais tímido. Mas isso era uma coisa um pouco diferente. Era difícil manter conversas, chegar numa menina, por exemplo. Eu também tinha interesses quase obsessivos por algumas atividades e uma inteligência acima da média. Eram coisas que as outras pessoas percebiam que era diferente e eu nunca acreditava”, explica Vinícius.

Relacionamentos interpessoais

Com tantos anos de terapia e o diagnóstico de autismo na vida adulta, a gente até poderia supor que Vinícius deu um salto de desenvolvimento em suas relações com as pessoas, certo? Mas nem sempre as coisas funcionam dessa forma, ou preto ou branco.

Vinícius conta que uma parte do resultado é a aceitação de sua condição, enquanto outra parte de fato resultou em formas de adequação da sua comunicação.

“Eu me sinto menos pior. Antes eu achava que tinha alguma coisa errada e eu ficava sempre com essa sensação. Então hoje eu fico mais tranquilo no sentido de poder interagir com uma pessoa. Tem aquela coisa dos comportamentos apreendidos, que vi na terapia. Tem várias coisas que ainda são bem difíceis para mim, especialmente por conta desse diagnóstico.

Mas eu tento apreender racionalmente certos comportamentos para eu poder interagir. Por isso hoje eu me sinto menos inseguro na hora de falar com as pessoas. E nem vejo mais como um problema o fato de eu ser mais tímido e fechado, o que antes me incomodava bastante. Literalmente, eu não consigo lutar contra isso. Então hoje, mesmo que seja mais racional e de uma forma não tão natural, eu tento agir de uma forma um pouco mais aberta“, conclui.

História real de diagnóstico de autismo na vida adulta

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Vinícius Monteiro

Como um autista se tornou professor

Se, por um lado, Vinícius tem tanta dificuldade em sua comunicação, por outro nos surpreende que ele tenha se tornado professor em seu esporte favorito: o tênis. Perguntamos a ele como foi que, de fato, isso aconteceu.

“Um dos meus primeiros empregos foi como professor de inglês. E, naquela época, era desesperador. Tanto que eu não durei muito tempo. Nessa época eu conheci um outro professor que disse algo que eu nunca esqueci. Ele falou que ser professor é ser um personagem. Então eu literalmente passei a encarnar o professor animado e incentivador. Aos poucos essa coisa do personagem foi diminuindo porque eu passei a fazer o que eu gostava, que é o esporte. Ficar num ambiente ao ar livre me faz muito bem e deixou as coisas mais naturais”, diz.

Mas, como conta Vinícius, ele mantém essa ideia por conta da visão que as pessoas têm do profissional de educação física. Para ele, o estereótipo do cara animado e cheio de energia nunca combinou com ele.

Existe o momento de sair do personagem?

Perguntamos, é claro, se Vinícius se sentia confortável em abrir o jogo para os seus alunos e para os colegas de profissão. Afinal, diante do papel interpretado, existia espaço para sair do personagem?

Para ele, sim. Mas isso dependia de condições muito específicas.

“Para mim, eles saberem ou não, não faz diferença. Mas sempre tem aquela coisa do estigma em volta do autismo. Pode não ser tão bom. Então eu tento não exatamente evitar, mas eu só compartilho isso quando eu me sinto muito confortável com a pessoa. Exatamente porque as pessoas têm o estigma quando você comenta alguma coisa do tipo. E isso, então, gera uma expectativa de reações. Então é uma coisa que é melhor deixar na gaveta até que eu confie na pessoa certa”.

Autismo em adultos

Fonte: Arquivo pessoal cedido por Vinícius Monteiro

O poder do tênis para os introspectivos

Outra coisa que chama bastante atenção na história de Vinícius é que ele não só é apaixonado por esportes. Ele vem dedicando sua carreira à prática e ao ensino do tênis. E ele defende os benefícios do tênis como um esporte perfeito para pessoas introspectivas, afinal, não depende que você tenha um time. Mas, ao mesmo tempo, oferece uma forma de vencer aspectos internos.

“O tênis é o esporte mais mental de todos. Eu sempre digo para os meus alunos que o tênis é uma forma de expressão. O comportamento dos grandes jogadores é de ser um dominador. Para ganhar no tênis, mesmo que sozinho, você tem que partir para cima. Tem que se aventurar e partir para “atacar” o adversário. E isso mexe muito mentalmente. Então, se você é uma pessoa mais fechada, em algum momento, nem que seja por você perder várias partidas, você vai começar a se incomodar com isso e tentar achar uma alternativa. Que é o poder do esporte, de fato, a gente se superar. 

A melhor coisa do tênis é que ele depende só de você. E a pior é que ele depende só de você. Então eu penso que é super recomendado. Eu sempre dei aula para alunos muito diferentes, uns mais tímidos outros mais expansivos. Eu lembro que dei aulas para algumas alunas do curso de pedagogia. Elas eram muito tímidas e mesmo assim estavam se preparando para ser professoras. Dava para ver a evolução no comportamento delas. Tem gente que quando vai fazer esportes coletivos trava por conta das cobranças. Pessoas mais tímidas não conseguem lidar com isso.”

Autismo na vida adulta: qual o melhor caminho?

Diferente de quando os autistas são crianças e recebem o diagnóstico, o adulto já tem uma vida muito mais estabilizada e com menos espaços para experimentar novas possibilidades. Por isso, pedimos para Vinícius nos dar uma opinião sobre o que fazer quando a pessoa só descobre o autismo na vida adulta.

O melhor caminho é a aceitação total ou ainda vale a pena investir no desenvolvimento de aspectos que antes incomodavam tanto?

“Eu acho que tem que ser as duas coisas. A gente tem que aceitar que é uma condição que nós não temos muito o que fazer. Claro que eu entendo que falo do ponto de vista de alguém que tem um grau leve e não tenho tanto comprometimento. Mas ainda assim, acho que a aceitação faz parte do processo. Até como uma maneira de se conhecer, porque isso é muito importante. Ter o diagnóstico ajudou a explicar muitas coisas que aconteceram comigo e que acontecem até hoje. Então isso tira um pouco da carga de culpa por você reagir e se comportar de certas formas.

Não acho que a gente precise ser “corrigido”, mas temos que sempre procurar melhorar. Se você tem algo que te incomoda ou que te atrapalha, é fundamental buscar melhorar isso. Por isso eu indico que todo mundo faça terapia, seja alguém que tem diagnóstico de autismo ou não. Isso é muito importante. Não adianta nada a pessoa buscar o diagnóstico e culpar só o diagnóstico por isso, e continuar fazendo coisas que lhe incomodem. Então acho importante cuidar disso, independente do quanto possa doer, do quanto possa ser difícil”, finaliza.

Descobrir o autismo na vida adulta não quer dizer que é tarde demais

O que a história do Vinícius nos ensina é que não é tarde demais para quem descobre o autismo só quando já é adulto. Se você sente que algo não se encaixa na sua cabeça e que pode ser autista, não deixe de se informar sobre o que é o autismo. E, claro, procurar ajuda profissional.

Quanto à boa informação, você pode contar com a gente. Siga o Autismo em Dia na rede social de sua preferência, ou no Facebook ou no Instagram. Tudo que a gente publica é revisado por médicos especialistas no transtorno do espectro do autismo.

E se você também tem uma história própria ou de conviver com alguém no espectro, vem conversar com a gente! Quem sabe a sua história não é a próxima a aparecer por aqui.

Até a próxima! =)

“O Autismo em Dia não se responsabiliza pelo conteúdo, opiniões e comentários dos frequentadores do portal. O Autismo em Dia repudia qualquer forma de manifestação com conteúdo discriminatório ou preconceituoso.”

11 respostas para “Autismo na vida adulta: como o esporte salvou a vida de Vinícius”

  1. André Costa disse:

    Boa tarde, qual seria o caminho para um adulto que acha que pode ter um grau no espectro do autismo , se ele quiser “tirar a dúvida ” ??? Agradeço e aguardo

    • Autismo em Dia disse:

      Oi André, tudo bem? Ficamos felizes que esse texto tenha chegado até você!

      Como comentamos outras vezes por aqui, a busca pelo diagnóstico pode ser desafiadora, mas por outro lado também muito libertadora. Vamos deixar aqui um vídeo de autistas que foram diagnosticados tardiamente, esperamos que a experiência deles possa te motivar e fortalecer a buscar respostas: https://www.youtube.com/watch?v=3spcsDqh_Kk

      Volte outras vezes! Um abraço.

  2. Rosilma Guimarães Cavalcante disse:

    Nossa que história linda, você mandou para Carolina Egbert, se não mandou ainda por favor manda .Ou como posso mandar. O Antonio está indo muito bem com as terapias, descobrir cedo faz a diferença, mas VINICIUS É AUTISTA GENIO NE MESMO ???

  3. Fernanda disse:

    André, vc deve fazer uma avaliação com psicólogo chamada neuropsicodiagnostico…se vc tiver convênio, deve procurar um neurologista q poderá solicitar essa avaliação.

  4. maria Rejane disse:

    Boa tarde
    Sou mãe de um autista leve, é muito dificil a convivencia com ele .
    Quando ele fica em crise nâo sei o que fazer sempre leio muito sobre o assunto mas ainda não encontrei respostas.

  5. Cristiane disse:

    Adorei a materia. A T.O. do meu filho acabou de nos recomendar que tentássemos tênis. Gostaria de ajuda para encontrar um professor de tênis para meu filho, que é TEA. Vcs teriam alguém pra indicar? Que desse aula em domicílio…

  6. Jan Rocha disse:

    Oi boa noite, minha ex, me fazia juras de amor e de repente, quis ir embora e foi, tínhamos tudo, uma relação ótima, ele tem um filho de seu primeiro casamento, este filho tem autismo, ela sempre teve atitudes estranhas, não parava quieta, nunca me olhava nos olhos, e sempre usava muita força para as coisas, nunca se incomodou com dores e machucados, e nunca se concentrava, ou conseguia dar continuidade a um trabalho, lendo seu blog, entendi que o diagnostico de depressão dela dês de criança, estava errado, ela é autista e não sabe, mas não fala mais comigo, ficou fria e nem fala com o meu filho que cresceu chamando ela de mãe, parece não ligar, agora não sei o que fazer, porque acho que a família sabe, ela sofre e eles não fazem nada, porque parecem ter o mesmo.

    • Autismo em Dia disse:

      Oi Jan, puxa, lamentamos que esteja passando por isso. Realmente muitos dos sinais que vc apontou chama bastante atenção para o autismo. Vocês ainda tem algum tipo de contato? Já tentou conversar com ela? Seria interessante você ter acompanhamento psicológico como apoio nesse momento difícil. Um abraço cheio de coragem.

  7. Renata Aparecida Ramaglia disse:

    Oi, Bom dia
    Onde encontro locais para prática de esporte, que aceitem autistas? Meu filho tem 18 anos e se interessa especialmente por futebol.
    No aguardo,
    Obrigado
    Renata

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