Mãe paulista de um adulto autista conta sua história


adulto autista

Postado por Autismo em Dia em 17/fev/2023 - 2 Comentários

Hoje a nossa proTEAgonista é a Aparecida Constantino, moradora Ermelino Matarazzo, em São Paulo. Ela, que fez questão de entrar em contato com a gente para contar sua história, é mãe do Gabriel, um adulto autista de 35 anos.

Como você talvez esteja imaginando, ser mãe de autista por quase 4 décadas não foi uma experiência fácil. Na década de 1980, o cenário para diagnósticos e o debate na sociedade era, sem dúvida, totalmente diferente. E Aparecida nos contou como foi essa jornada que a trouxe até aqui.

Quer conhecer essa história? Então continue a leitura com a gente!

Índice

Muito antes de ser um autista adulto, veio a descoberta

Apesar de hoje sabermos que Gabriel é autista severo, os primeiros sinais que Aparecida notou no filho não eram tão diferentes do que relata a maioria das mães. O menino não falava, não interagia, trocava o dia pela noite e, no geral, atrasou todos os marcos do desenvolvimento.

A primeira vez, no entanto, que Aparecida ouviu falar em autismo foi em uma propaganda de televisão. O conteúdo do vídeo fez ela perceber semelhanças do personagem com o filho dela na vida real.

Foram alguns anos lidando com as dificuldade com o filho até que, ao passar por um exame feito no conhecido Instituto Butantan, Gabriel foi diagnosticado com a síndrome do X-frágil. Esta síndrome diz respeito a um distúrbio no cromossomo X que causa deficiências mentais e distúrbios do comportamento. ¹

Por volta dos 5 anos de Gabriel, Aparecida finalmente conseguiu uma consulta com um renomado neurologista da região que, enfim, deu o diagnóstico de autismo.

A dependência de um autista severo

Aparecida conta que, desde muito pequeno, Gabriel dependia dos pais mesmo para funções básicas.

“Ele é muito dependente de mim. Sabe fazer as coisas, só que ele não faz. Quando era pequenininho, ele pegava a minha mão e apontava quando queria alguma coisa. E ele continua assim até hoje. Coisas simples como beber água e ir ao banheiro, com muito custo consegui ensinar ele a fazer. Mas, por exemplo, ele não se limpa sozinho.

E como ele sempre viveu junto de mim, ele gosta que eu faça as coisas para ele e não as outras pessoas. A não ser que eu não esteja por perto. Mas ele é um rapaz tranquilo. Talvez porque eu sempre procuro fazer o que ele pede. Procuro, também, não deixar ele se irritar. Ele é adulto autista severo, mas não é nem agitado demais nem agressivo”, explica Aparecida.

o autista adulto - história real

Fonte: arquivo pessoal – cedido por Aparecida Constantino da Silva Barros

As intervenções na vida de um adulto autista

As primeiras intervenções especializadas que Aparecida conseguiu para o filho foram já bem tardias. E só depois de um processo judicial. Com 18 anos, Gabriel finalmente entrou para uma unidade da Associação de Amigos do Autista (AMA), em Parelheiros, SP. A AMA é uma extensa rede de infraestrutura multidisciplinar para o acompanhamento de autistas.

“Eu ficava em casa com ele pensando ‘meu Deus, para onde eu vou? o que vou fazer?’ Se eu não tinha dinheiro para pagar uma escola particular, como eu ia educar esse menino? Eu escrevia para as rádios, para tudo que é lugar de imprensa. Mas a única que, na época, me deu uma resposta que deu certo foi a revista Época. Eles que me orientaram a procurar a Procuradoria do Estado.

Eu fiz tudo que a Procuradoria me pedia. Mas o atendimento, ainda assim, foi negado. Na época, ele ainda tinha 13 anos. E ainda demorou 5 anos para eu conseguir levá-lo para a escola. Mas quando conseguimos, veio tudo junto. O transporte para levá-lo e a vaga da AMA”, explica.

Aparecida conta que, já nos primeiros meses, o filho apresentou resultados, como a regulação do sono, por exemplo. Ela explica que ir até outro município todos os dias para manter a frequência escolar de Gabriel envolveu diversos sacrifícios. No entanto, ela conta que era movida por uma crença inabalável da evolução do rapaz.

O poder dos veículos de comunicação para o autismo

É curioso notar que a história de Aparecida traz outras conexões com o fato de ela estar contando sua história no Autismo em Dia, um site que é especializado em autismo e algo que, mesmo que em outros formatos, era impensável quando ela mais precisou.

Assim, perguntamos à Aparecida que reflexões ela faz sobre a importância de mais veículos de imprensa falarem sobre autismo.

“Daquela época até hoje, as coisas mudaram bastante. Tanto que, hoje, as mães percebem os sinais quando os filhos são bem pequenos. E por que? Por causa da informação. E eu vejo, assim, esses meios como os principais veículos para influenciar a pessoa a ter conhecimento, a buscar os lugares certos. Eu me lembro de ir em tantos outros lugares, ia aqui, ia lá… e eu me sentia muito triste e humilhada.

E agora ainda precisa melhorar, mas já está muito melhor. E quanto mais conhecimento sobre saúde, mais as pessoas vão evoluindo”, conclui Aparecida.

proTEAgonista - transtorno autista grave

Fonte: arquivo pessoal – cedido por Aparecida Constantino da Silva Barros

A mãe de um adulto autista tem preocupações no presente e olhos no futuro

Como adulto autista de grau severo, as preocupações em volta de Gabriel envolvem questões bastante burocráticas. Como, por exemplo, a necessidade de suprimentos diante da impossibilidade de habitar o mercado de trabalho. Ao menos o mercado de trabalho tradicional, pois aqui temos outras histórias de autistas adultos que inventaram sua própria forma de renda.

No entanto, cada caso é um caso, e para Gabriel, a família entende que ele não reúne as capacidades ideais para ter empregos formais. Por isso, Aparecida conta que eles possuem uma curatela, que é um documento de medida excepcional para amparar qualquer pessoa que tenha mais que 18 anos e que precise do apoio de outro adulto para praticar atos patrimoniais (como, por exemplo, ter um emprego). ²

Como este documento, ela garante, entre outras coisas, o benefício salarial do LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social). E Aparecida conta que este salário é indispensável para Gabriel e para a família toda.

“Nós sempre usamos o LOAS e continuamos usando. Afinal, meu marido trabalha como autônomo, eu trabalho apenas em casa, cuidando do Gabriel, e o LOAS é o único dinheiro certo que temos todo mês. Durante a vida, nunca foi possível guardar um dinheiro além das necessidades dele e da casa. E agora que a gente está na terceira idade, está mais difícil ainda. Meu marido não arruma mais emprego e eu nem penso nisso. Afinal, quem vai cuidar do Gabriel? E, desde a época de solteira eu acreditava que, quando eu tivesse um filho, eu ia querer cuidar dele até que tivesse a maioridade.

No entanto, meu filho já nasceu necessitando muito mais de mim. Então eu decidi ficar em casa, não porque eu não queria trabalhar, mas porque cuidar do meu filho era mais importante”, explica.

As relações familiares

Outro motivo pelo qual Aparecida não abre mão de seu papel como mãe é que, como ela conta, tem pavor do que pode acontecer no futuro. Ela explica que não se sente confortável com a ideia de deixá-lo sob a responsabilidade de outras pessoas. Mesmo com a irmã mais nova de Gustavo, que, apesar da boa relação entre os dois, Aparecida entende que a outra filha construiu a própria vida.

“Eu quero ver se consigo deixar encaminhado um lugar para quando eu não estiver mais aqui. Na AMA tem algumas residências, mas estão todas lotadas. Eles têm espaço para construir mais, mas falta dinheiro. Até para construir um muro no local eles fizeram uma vaquinha na internet.

São tantas perguntas sobre o futuro que a gente fica arrasada só de pensar. E eu penso no meu filho demais. Quando eu precisei fazer uma cirurgia de varizes, por exemplo, foi bem difícil meu marido fazer com que ele não ficasse me pegando, porque ele faz isso o tempo todo. Quando acontece de uma mãe ter um problema de saúde, elas não têm onde deixar o filho autista.

O serviço público precisa olhar pra AMA e para outros esforços pró-autismo que existem por aí”, finaliza Aparecida.

Autismo em Dia, um espaço de histórias reais

Aparecida tem uma história única, mas as dificuldades que ela, o marido e o filho passam podem ser, também, a realidade de outras famílias. O Autismo em Dia permanece um espaço onde as pessoas podem contar suas histórias e, através delas, chamar atenção para problemas coletivos. Do outro lado da tela, sempre haverá outra pessoa que vai se sentir menos sozinha diante do autismo com a sua história.

Por isso, entre em contato aqui pelo site ou pelas nossas redes sociais que o próximo proTEAgonista pode ser você!

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Até a próxima!

 

Referências bibliográficas e a data de acesso:

1. Drauzio Varella – 24/01/2022

2. Ministério Público do Paraná – 24/01/2022

 

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2 respostas para “Mãe paulista de um adulto autista conta sua história”

  1. Aparecida Constantino disse:

    Vou ser a primeira a comentar,o Autismo tem muitas histórias,inclusive uma pior que a outra,de mães com dois ou mais filhos Autistas,grau Severo,e pobres,porque não dizer quase “Miseráveis”,palavra que dói,mas é verdade,mesmo com o benefício,fica impossível cuidar deles.A realidade é que os Autistas necessitam de um tratamento Multidisciplinar,e isso custa muito.

  2. Maria Gleiceane disse:

    Querida Aparecida! Também sou mãe atípica. Tenho 2 autistas de 25 anos e sei bem como é a sua preocupação com o futuro do seu amado filho. As vezes em oração choro bastante e até brinco, dizendo ao Senhor que mães assim deveriam ganhar um bônus vitalício da natureza rsrs. Mas, quero te falar que aprendi a descansar no Senhor! Ele providenciará tudo para o seu Gabriel, quando não estiveres mais aqui. Como também cuidará dos meus Victor e Igor. Fica com Deus guerreira. 😘

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