Ser mãe de autista: um desafio superado de um jeito criativo


Postado por Autismo em Dia em 05/mar/2020 - 20 Comentários

Com pouco mais de 100 mil habitantes, o município de Araxá, em Minas Gerais, reserva aos visitantes encantos naturais, históricos e gastronômicos típicos da região Sudeste. E é de lá também que vem a surpreendente história que vamos te contar. A enfermeira Eloá Alves precisou encarar situações complicadas após seu filho, Paulo Antônio, ser diagnosticado com Autismo. Mas algumas circunstâncias curiosas a fizeram vencer esse desafio de ser mãe de autista de uma maneira criativa. E que acabou dando tão certo que a iniciativa vem se espalhando pelo Brasil.

Índice

Ser mãe de autista: como tudo começou

Atualmente, Paulo Antônio tem sete anos, mas o diagnóstico fechado de autismo veio quando o menino tinha três anos, depois de várias análises médicas que começaram no oitavo mês de vida. Isso ocorreu após suspeitas de Eloá, que, além de enfermeira, é especializada em psiquiatria e neuropsicofarmacologia (que estuda remédios atuantes na influência do comportamento). Somado a isso, o marido de Eloá é médico, especializado em saúde da família. A experiência da família no ramo da saúde logo fez chamar atenção para o caso de Paulo Antônio, que não vinha demonstrando os mesmos padrões de uma criança neurotípica – que é um dos primeiros sinais de que a criança é autista.¹

Apesar de seu trabalho já envolver questões comportamentais e doenças neurológicas, a experiência de Eloá se limitava a transtornos como esquizofrenia e bipolaridade. E ela ainda não tinha tido a experiência de lidar com uma criança Autista. Quis o destino que esse momento acontecesse dentro da própria casa. Foi a partir da chegada de Paulo Antônio que Eloá sentiu que então, sua vida ganhava um novo protagonista.

orgulho de ser mãe de autista

Fonte: Arquivo Pessoal – Foto cedida por Eloá Alves

Mães de autistas: compartilhando experiências

Eloá conta que, no começo, não recebeu o apoio e o acolhimento que esperava. “Por sermos da área da saúde, todos diziam que eu saberia cuidar muito bem dele”. Diz.

Certamente a experiência dos pais fez a diferença, mas nada pôde preparar Eloá pro que viria acontecer entre os anos de 2017 e 2018, quando Paulo Antônio teve as primeiras grandes crises decorrentes do autismo.

Se sentindo solitária quanto às questões do filho, foi nessa fase que Eloá descobriu e procurou o Grupo de Apoio a Pais de Autistas de Araxá (que começou, na verdade, como um pequeno grupo dentro da FADA – Associação de Assistência à Pessoa com Deficiência de Araxá). Hoje, com o nome de A & +, o grupo virou de vez uma Associação, já independente, não dispensa o apoio dos profissionais da área, mas é organizada e dirigida principalmente por mães de autistas.

“A gente recebe o diploma, mas não o diploma de mãe. Ainda mais o de mãe de autista”, comenta Eloá, emocionada ao lembrar dessa época. Eloá se sentiu agraciada pelo carinho que recebeu da A & +, que entendeu que, apesar de ela ter experiência na área da saúde, ela estava ali como mãe, antes de qualquer coisa. Assim começou a trajetória de mãe de autista ativista de Eloá – que viria a ajudar muitas mães e pais que também lutavam para cuidar dos filhos com o Transtorno do Espectro Autista.

A&+ divindo as alegrias e desafios de ser mãe de autista

Fonte: Arquivo Pessoal – Foto cedida por Eloá Alves

Acolhendo outras famílias

Às portas do Dia de Conscientização do Autismo, que acontece no dia 2 de abril, Eloá conta um pouco das atividades que a Associação vem desenvolvendo.

Além do papel de mãe de profissional da entidade, Eloá é uma das “acolhedoras” de mãe de autista, como assim são chamadas as pessoas que participam ativamente das atividades, principalmente acolhendo – literalmente – novas famílias que procura a Associação.

Num escritório modesto, Eloá faz acolhimentos individuais, onde os pais relatam as dificuldades mais íntimas que eles passam com seus filhos. São problemas que vão desde os impactos de receber o diagnóstico até problemas conjugais pelos quais passam os casais que precisam lidar com as dificuldadesora leves, ora moderadas, ora severas – dos filhos. E tudo isso ocorre de forma bastante profissional: tratado no sigilo e resumido em um prontuário de cada família.

Outro formato é o acolhimento feito em grupo uma vez por mês, num salão paroquial gentilmente cedido à Associação, onde as mães desabafam suas histórias e ainda recebem orientações de profissionais convidados – no começo de 2020, por exemplo, o grupo recebeu uma pedagoga que ensinou aos pais como suavizar as ansiedades do começo de um ano letivo.

Clique aqui para conhecer o Instagram do associação A & +.Foto do Arquivo Pessoal

Uma ideia simples e eficaz

Por falar em ano letivo, numa das crises de seu filho na escola, Eloá precisou tomar uma iniciativa para evitar os olhares preconceituosos.

“Todos acharam que meu filho estava de birra e eu era uma mãe incapaz de controlar o meu filho”, conta Eloá, lembrando que no dia precisou “arrastar” o filho por dois quarteirões, enquanto o menino lutava com a mãe, após uma longa tentativa de tirá-lo do ambiente da escola, que no horário estava com todos os portões trancados. No fim, ambos saíram fisicamente machucados daquela situação. “Os outros pais olhavam estranho, tentavam afastar seus filhos de perto”, relata Eloá.

A “luta” terminou quando Eloá e Paulo Antônio chegaram ao carro, já com bastante dificuldade até de destrancar as portas. Foi assim que Eloá chegou à conclusão de que precisava sinalizar seu carro para que os outros motoristas e pedestres soubessem que aquela mãe poderia passar por situações difíceis. Além disso, Eloá remeteu à Lei Berenice Piana, que, entre outras coisas, garante direito a vagas especiais para carros de famílias com pessoas autistas. A Lei Berenice Piana é uma lei que faz alcançar à pessoa autista os mesmos direitos previstos na Lei de Proteção à Pessoa com Deficiência.

Depois disso, Eloá procurou opções na internet e encontrou um modelo de adesivo que ela imprimiu por conta própria e passou a circular portando esse aviso em seu carro.

adesivos de identificação para carros e casas de autista ser mãe de autista

Fonte: Arquivo Pessoal – Foto cedida por Eloá Alves

Do carro à porta de casa

Mas os problemas não pararam por aí.

Em meio às constantes crises que aconteceram na época com Paulo Antônio, Eloá também passava por momentos difíceis dentro de casa. “Por causa dos gritos, a vizinha vinha ver o que estava acontecendo, no que eu expliquei que o Paulo é um garoto autista e acontecia de ele gritar e fazer muito barulho”. A mãe do menino precisou explicar, também, que as coisas não eram como pareciam de fora. Às vezes, Eloá estava apenas escovando os dentes do filho ou cortando as unhas. Mas, naqueles momentos o menino gritava tanto que parecia que Eloá estava batendo na criança.

Do carro, a ideia do adesivo também foi parar na porta de seu apartamento.

Depois de um colega de trabalho ter visto e elogiado o adesivo no carro de Eloá, ela imprimiu uma quantidade maior e levou para distribuir na Associação, onde descobriu, novamente, que não estava sozinha e muitos outros passavam por momentos semelhantes.

Logicamente, o adesivo foi um sucesso. Hoje, no município de Araxá, muitos carros e motos já são vistos circulando com o adesivo.

Eloá conta que o adesivo foi de grande utilidade para ela e para outras mães: “Depois que passei a utilizar o adesivo, algumas pessoas vieram até pedir desculpas pela forma como agiram quando não sabiam do autismo do meu filho”.

Medidas Simples, mas necessárias

Imprimir, distribuir e colar um adesivo podem parecer medidas simplórias, mas as informações contidas podem fazer diferença na hora dos pais e familiares de uma criança autista solucionarem uma crise.

A questão da distância entre o carro dessa família e um outro veículo, por exemplo, é crucial. Numa situação de crise em que pais e criança precisam se locomover, é extremamente necessário que a distância de, pelo menos, 1,5 metro seja respeitada.

Já imaginou essa família precisar e ter a infelicidade de ter o carro trancado por outro?

Além disso medidas comportamentais precisam ser encaradas com respeito e certa naturalidade por vizinhos e outras pessoas próximas, que também podem cumprir seu papel de não desenvolver hábitos que atrapalhem o sossego das pessoas com Transtorno do Espectro Autista – em geral, muito mais sensíveis que as demais pessoas.

ser mãe de autista exige disposição e criatividade

Fonte: Arquivo Pessoal – Foto cedida por Eloá Alves

Ser mãe de autista: muito além do adesivo

Mas não é só no dia-a-dia ou em momentos de crise que a sinalização do carro se faz importante. Na hora de fazer um passeio ou mesmo uma viagem de férias, algumas dicas são essenciais para minimizar o impacto da mudança na rotina para essas crianças.

Abaixo, Eloá lista uma série de cuidados que você pode ter para tornar a viagem em família tranquila e relaxante:

  • Antecipe os roteiro da viagem, mas não tanto a ponto de deixar a criança ansiosa
  • Ajude a criança a escolher um brinquedo ou algum objeto que a deixe mais tranquila
  • Procure um horário mais tranquilo para sair de casa, evitando momentos com pico de calor
  • Se a criança já tiver idade de entender, explique tudo que vai acontecer na viagem, pois são as incertezas que as deixam ansiosas
  • Mantenha ou seu corpo com algum sinal de estar viajando com uma criança especial
  • Mantenha um ambiente calmo durante a viagem e passe constante segurança à criança

A história da Eloá e do Paulo Antônio mostram como todas as dificuldades da vida um autista – também da mãe e do pai – podem ser contornáveis, pela medicina, com medidas criativas, com o apoio de outras pessoas e, principalmente, com muito amor. E a única coisa que é inaceitável é o preconceito.

Se você também tem um autista na família, conheça nosso superguia de atividades para fazer em casa. Esse pode ser um momento gostoso de interação e diversão com o seu filho!

Superguia de brincadeiras para fazer em casa

Você também tem algo especial pra contar? Entre em contato com a gente e conte a sua história! Ela pode aparecer aqui no Autismo em Dia.

Referência Bibliográfica e a data de acesso

1. Tua Saúde – 18/02/2020

 

“O Autismo em Dia não se responsabiliza pelo conteúdo, opiniões e comentários dos frequentadores do portal. O Autismo em Dia repudia qualquer forma de manifestação com conteúdo discriminatório ou preconceituoso.”

20 respostas para “Ser mãe de autista: um desafio superado de um jeito criativo”

  1. Cristina Bispo disse:

    Olá… Muito bom ler histórias assim como da Eloá… Pois nós identificamos … Sou mãe da Rafaela, uma moça de 31 anos… Nossas lutas, conquistas e vitórias, são diárias… Aprendemos mais, do que ensinamos… Temos que nos adaptar à elas TEA… E não eles a nós… Assim sempre teremos progressos… ???

    • Autismo em Dia disse:

      Olá Cristina, ficamos contentes que as histórias que compartilhamos por aqui toquem o coração de outras famílias <3 Seria muito legal contar sua história e da Rafaela, já que o autismo no sexo feminino e o autismo em adultos ainda tem pouca visibilidade não é? Vamos conversar mais sobre isso? Um grande abraço de toda equipe do Autismo em Dia!

  2. Fabiana silva dias disse:

    Sou Fabiana de sp mae da ryanna autista amei a história ser mãe de autista e uma dádiva .

    • Autismo em Dia disse:

      Oi Fabiana! Ficamos tão felizes quando os pais vem aqui comentar que gostaram das histórias que compartilhamos! Muito obrigada, um abraço em você e na Ryanna!

  3. Elizângela Rodrigues disse:

    No meu caso esta um pouco complicado tenho um filho de 3 anos de idades desde um ano dele ele ser trata com neuropediatria,minha dificuldade é que o neurologista dele nunca dis pra mim o que ele tem ,ele toma respiridona há um ano pois não consigo dormir com ele é muito agitado anda pra lá e pra cá de um tempo pra cá ele vem montado os brinquedos dele em cima do outro e quando não consegue chora,ele não fica com ninguém que não conheça exemplo meu irmão minha irmã ,só minha mãe e meu marido e filho de 14 anos que também tem o probleminha deles pra mim é difícil não sei lê dá com ele é bem pra onde ir pois chega um ponto que choro com ele pois não sei como ajuda ele.

    • Autismo em Dia disse:

      Oi Elizângela, como vai? Puxa, imaginamos que não deve ser nada fácil! Esperamos que se sinta acolhida e bem vinda aqui no blog. Olha só, nós temos uma área aqui no site onde você pode pesquisar entidades, associações e grupos de apoio e suporte ao autista e seus familiares, muitos deles oferecem tratamentos gratuitos. Veja: https://www.autismoemdia.com.br/pais-maes-e-cuidadores/#mapa
      É bem importante incluí-lo nas terapias complementares para desenvolver suas habilidades sociais, melhorar a qualidade do sono e ajudar na regulação sensorial.

  4. Celma Esteves disse:

    Tenho um filho de 4 anos autista moderado as vezes Tenho dificuldade para lidar com as birras dele, estava fazendo teràpia no APAE da minha cidade mais com a pandèmia precisou parar e pra complicar ele e nao verbal mais tenho fe que em nome de Jesus ele vai melhora.

    • Autismo em Dia disse:

      Oi Celma, puxa essa pandemia atrapalhou tantos planos né? Mas assim como você, estamos confiantes que seu filho vai evoluir muito! Ele tem só 4 anos, vai aprender um montão de coisas ainda!!! O tratamento é bem importante mesmo, vamos torcer para as coisas voltarem logo ao mais próximo do normal. Um abraço, volte sempre =)

  5. Aparecida Constantino disse:

    Amei a história,e acho que vou amar todas, porque me identifico sempre.Tenho um Autista,com 33 anos.

    • Autismo em Dia disse:

      Oi Aparecida, ai que legal de ver você de novo aqui! Volte mesmo várias vezes, vamos combinar para você contar sua história também ♥

  6. Margarida disse:

    É preciso muito jogo de cintura para lidar com as crises, muitos criticam dizendo que é só birra, criança problemática e pior tem alguns que acham que devem intervir. O que acaba piorando a situação. Ótima iniciativa. Soum mãe de uma princesinha autista de três anos!

    • Autismo em Dia disse:

      Oi Margarida, perfeitas colocações! Obrigada pela contribuição ? Um beijo para você e sua pequena!

  7. Roberto Silva de Araújo disse:

    Olá sou pai do Vitor ele foi diagnosticado com autismo aos 2 anos e 9 meses! Eu já desconfiava que algo estava errado pois ele não falava ainda é devido ao jeito que ele brincava, as crianças neuróticas quando ganham um brinquedo novo expressam emoção e meu filho não fazia assim.
    Eu comprava brinquedos pra ele e logo em seguida ele já trocava por uma simples caixa de sapato vazia.
    Tudo ainda é muito novo pra mim! Nos o diagnóstico veio em meio a pandemia e não tivemos mais o acompanhamento da fonoaudiologia pois fechou tudo.
    Gostaria de ajuda pra saber como proceder de agora pra frente.

    • Autismo em Dia disse:

      Oi Roberto. Bem-vindo ao blog!

      Em primeiro lugar, queremos deixar nosso abraço de coragem e acolhimento. Sabemos que esse momento pode ser muito angustiante. Ainda mais em meio a pandemia.

      Queremos recomendar a nossa cartilha chamada “Descobrindo o Infinito Azul” pensada especialmente para esse momento de diagnóstico:

      https://materiais.autismoemdia.com.br/cartilha-autismo

      Você também poderá encontrar ajuda em ongs e entidades que cuidam de autistas e costumam orientar os pais sobre as terapias e prestam apoiam emocional. Aqui no blog, você pode achar algumas sugestões pelo mapa, quem sabe tem alguma perto de vocês: https://www.autismoemdia.com.br/pais-maes-e-cuidadores/#mapa

      Sabemos que nesse momento pode ser difícil começar as terapias, por isso, façam o melhor que puderem, mas não se desesperem. Em breve deveremos ter a vacina, e os autistas inclusive tem direito de tomar antes!!!

      Aqui no blog você vai encontrar muitos outros textos que também podem ajudar ?

  8. Silmara Freitas disse:

    Meu filho tem 3anos de idade. Essa semana a pediatra ne falou que “possivelmente” ele sofre de TEA.

  9. Eliane da silva berto disse:

    Boa tarde. Meu nome é Eliane moro na região metropolitana do Rio de janeiro.
    Meu filho vai fazer 4 anos agora em maio e sempre foi uma criança cheia de birra(assim pensava eu).
    Até chegar o dia de hoje dia 9/3/22 njnca mias vou esquecer essse dia. Ao leva-lo a pediatra diferente do que costumava ir recebo a notícia: seu filho tem todos os sintomas de uma criança autista. Meu mundo literalmente deu voltas. Como que eu poderia imaginar isso do meu filho. Ainda estou em choque. Mas Deus mais uma vez vai me capacitar pra dar conta a cada dia.

  10. ELIANA disse:

    Mães de Autismo…sei que não é fácil durante o resultado é perante as mudanças dos nossos filhos.. mais saiba que tudo é uma lição de vida para mim e pra vcs …saiba que Deus nos abençoou pois temos uma crianca especial que precisa do nosso amor é carinho …
    as crises não é fácil de começo mais aos poucos eles nos moldao que o tempo passa e vemos o quanto ele mudaram e quanta evolução teve…isso é gratidão….
    lembrace que nossos filhos com o sem autismo sempre precisará de nos para ensinarmos. e compreendermos o que eles querem…
    muitas das vezes podemos estar só mais Deus jamais permitirá que ficarmos só pois ele está sempre ao nosso lado.

  11. Joseanny disse:

    Boa noite meu menino o Miguel foi diagnosticado com TEA, agora aos 15 anos. ele sempre teve um comportamento diferente das demais crianças, porém achávamos que eram fazes e com o tempo mudariam, mas ao chegar ao ensino médio os sinais ficaram muito visíveis, hj me encontro perdida como suprir as necessidades dele, como compreender esse novo mundo.
    estou confusa e preocupada.
    ele está fazendo terapias e tendo acompanhamento psiquiátrico, essa história mexeu comigo, é tudo muito novo pra mim.

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